Para PGR, decreto beneficiou presos
por crimes de corrupção e peculato. Governo diz que ministro do STF invadiu
competência do presidente ao suspender efeitos do decreto.
Por Rosanne D'Agostino e Mariana Oliveira, G1 e TV Globo —
Brasília
Ministros do STF durante a sessão do último dia 22 que começou a julgar
a validade do decreto natalino do presidente Michel Temer — Foto: Nelson
Jr./SCO/STF
O indulto é um perdão de pena e costuma ser concedido todos os anos em
período próximo ao Natal, atribuição do presidente da República. O decreto de
Temer estabeleceu que poderia receber o perdão quem cumpriu um quinto da pena
em caso de crimes sem violência ou grave ameaça, sem limite máximo de pena para
concessão.
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STF vai julgar nesta quarta validade de decreto de indulto de Natal
editado por Temer
Para a Procuradoria Geral da República, o decreto beneficiou presos por
crimes de colarinho branco, como corrupção e peculato.
O julgamento começou na quinta-feira (22) e deve continuar com o voto do
relator, ministro Luís Roberto Barroso, que concedeu liminar (decisão
provisória) em março limitando a aplicação do indulto.
Na liminar,
Barroso aumentou o período de cumprimento para pelo menos
um terço da pena, permitindo indulto somente para quem foi condenado a mais de
oito anos de prisão. Ele também vetou a concessão para crimes de colarinho
branco e para quem tem multa pendente.
O julgamento no STF se limita à validade do decreto editado em 2017. A
cada ano, um novo decreto é editado pelo presidente da República, mas a decisão
do STF não diz respeito aos anteriores.
Um dos pontos centrais do julgamento é responder se o decreto é
prerrogativa "discricionária" do presidente da República, ou seja, se
ele tem o poder de definir a extensão do benefício considerando os critérios de
conveniência. Para a PGR, o decreto foi editado fora de sua finalidade
jurídica, que é humanitária.
Caso seja mantido, o decreto beneficiará quem cumpria os requisitos em
25 de dezembro do ano passado. Condenados por crimes como corrupção que
atendessem às regras, por exemplo, poderiam ser liberados.
Contra o indulto
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou que houve “uso
excessivo das prerrogativas presidenciais” na edição do indulto sem
“justificativa razoável”. “O chefe do Poder Executivo não tem competência para
legislar”, disse.
Para Raquel Dodge, o decretou ampliou “desproporcionalmente benefícios e
criou cenário de impunidade no país”, gerando insegurança jurídica e
“desfazendo a igualdade na distribuição da Justiça”.
“Houve intuito de alcançar condenados por crimes contra administração
pública, que não vinham sendo beneficiados de forma tão generosa nos outros
indultos”, disse.
À TV Globo, Dodge afirmou ter "convicção" de que muitos dos
condenados na Operação Lava Jato seriam diretamente beneficiados pelo decreto.
"Estamos todos num esforço muito grande de investigação e de
punição dos crimes de colarinho branco. Exatamente num momento em que
conseguimos penas mais severas, efetividade na punição dos crimes do colarinho
branco, surge um decreto que indulta as penas aplicadas", disse.
Segundo Dodge, cabe ao Poder Judiciário fixar o tamanho da pena, "e
de uma pena que iniba o condenado de tornar a delinquir", o que, segundo
ela, foi desrespeitado pelo indulto.
Para a procuradora-geral, essa regra tornou "nula ou sem sentido a
condenação criminal conseguida a duras penas nesses processos contra a
corrupção, a lavagem de dinheiro e o crime organizado". "A mensagem
que devemos dar é de que isso é inadmissível."
A favor do indulto
Gabriel Faria Oliveira, defensor público-geral federal, autoridade
máxima da Defensoria Pública da União, considera que o decreto deve ser mantido
porque beneficia principalmente pessoas pobres condenadas por crimes sem
violência e sem ameaça à pessoa.
“Por conta de uma politização equivocada, onde tudo virou Lava Jato, o
decreto de indulto está sendo desmerecido por causa de um ou dois potenciais
beneficiados”, afirmou ao G1.
Segundo ele, “dos 22 condenados na Lava Jato, somente um seria
beneficiado efetivamente pelo decreto”.
Para o defensor, caso o indulto deste ano seja flexibilizado, há o risco
de que todos anos haja contestação judicial. “É um ativismo judicial não
compatível com a Constituição”, completou.
Indulto de 2018
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, subordinado ao
Ministério da Segurança Pública, já aprovou o texto
do indulto de Natal deste ano, mais rigoroso que o anterior. As
diretrizes desse texto podem ou não ser seguidas por Temer ao editar o decreto.
A proposta veta a concessão de indulto a quem pratica furto com uso de
explosivos – explosão de caixa eletrônico, por exemplo – e todos os crimes
relacionados à corrupção (ativa, passiva), incluindo as modalidades
internacionais de corrupção.
Também acaba com a concessão do benefício a quem cometer crimes
financeiros, relacionados a licitações, tortura, lavagem de dinheiro,
organização criminosa e terrorismo.