Nem os santos têm resolvidos o problema da falta
de água sertanejos (Foto: Taiguara Rangel/G1)
A aposentada Maria Rosendo de Andrade, 77 anos, é uma das paraibanas
que sobrevivem ao colapso no abastecimento de água no município de
Triunfo, Alto Sertão, há pelo menos um mês e meio. O racionamento de
água é uma realidade que atinge, segundo a Companhia de Água e Esgotos
(Cagepa), 15 cidades e nove distritos na Paraíba nas regiões do Brejo,
Curimataú e Sertão, levando agricultores a celebrarem uma missa pela
chuva.
“Essa falta de água já acontece desde outubro. Não sai nada na
torneira, só temos para consumir o pouco que ainda resta na caixa d'água
e no poço. A gente tem que esperar, porque o açude também não tem mais
água”, afirmou, em referência ao reservatório da Gamela, que está abaixo
de 10% da sua capacidade.
O G1 viajou 1,5 mil quilômetros cortando o
interior da Paraíba, percorreu 7 cidades e mostra, nesta quinta-feira
(29), o sofrimento de paraibanos que enfrentam uma das piores secas dos
últimos 30 anos. Na sexta-feira (30), uma reportagem vai revelar a
destruição dos pastos e o "cemitério de animais" que se forma a céu
aberto por causa da estiagem no Sertão.
O açude Gamela abastece mais de nove mil habitantes e não resistiu à seca (Foto: Taiguara Rangel/G1)
Praticamente todos os nove mil triunfenses da cidade e zona rural se
revezam na busca por água no Poço José Simão, construído pela
Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) no final da
década de 80. O vidraceiro Odílio Nunes Torres, de 42, diz que a água
serve para o consumo de quase toda a população.
“Água não é muito boa, mas a gente usa para tudo. Não chega a ser
imprópria para beber, mas a gente tem que beber, porque está faltando
para todo mundo. É o único lugar que dá para buscar água aqui na
região”, disse conformado.
De acordo com a Aesa-PB, as regiões do Cariri, Curimataú e Sertão do
estado são as mais castigadas pela estiagem. As chuvas registradas de
fevereiro a maio foram 62% abaixo da média histórica. “Entre fevereiro e
maio, a análise constatou que o Alto Sertão ficou 48,6% abaixo da
média, o Cariri/Curimataú ficou 78,9% abaixo e o Sertão com 58,7%
inferior ao índice histórico”, afirmou a meteorologista Marle Bandeira.
"Clamamos pela ajuda de Deus", diz o padre Djacy
Brasileiro (Foto: Taiguara Rangel/G1)
Na tentativa de amenizar a angústia da escassez de água, os sertanejos
oram pela chuva. Uma missa a céu aberto realizada no sítio Tabuleiro,
zona rural de Pedra Branca, foi proclamada pelo padre Djacy Brasileiro.
“Não queremos paliativos, queremos solução. Clamamos nessa missa pela
ajuda de Deus e protestamos pela ajuda do Governo. É um cenário
devastador de morte, não podemos mais ficar calados”, proferiu o padre.
Apesar da pouca água, mesmo em meio à lama e ao solo ressecado, o
agricultor Antônio Farias Alves, de 44 anos, vai ao açude da Gamela
pescar. “O importante é que tem alguns peixes ainda. Melhor pegar logo.
Venho quase todo dia, porque logo eles vão morrer todos. Aqui só tem
lama e é melhor pescar para a gente comer alguma coisa do que deixar
eles morrerem assim”, disse.
'Melhor pescar para a gente comer do que deixar os peixes morrerem assim" (Foto: Taiguara Rangel/G1)
No açude Sítio Novo, zona rural de Conceição, os irmãos Natália e Joel
Araújo Campos buscam água todos os dias em um açude quase seco. Natália,
de 10 anos, explica que a viagem é longa. “Viajamos a pé, com os burros
carregando a água no tonel. São 30 minutos andando, duas viagens por
dia. É água para a gente e o gado, só tem esse açude para todo mundo na
região”, disse. Joel, oito anos, reclama do desgaste. “Não tem tempo de
brincar, tenho que estudar e acordo cedo para ajudar a buscar água”,
afirma.
Segundo o secretário de Infraestrutura do Estado, Efraim Morais, além
dos R$ 10 milhões que foram enviados este ano pelo Ministério da
Integração para a operação carro-pipa, foi apresentada uma nova proposta
em outubro solicitando mais R$ 34 milhões, para dar continuidade ao
programa por mais 180 dias. De acordo com a Defesa Civil estadual, 250
carros-pipa estão contratados pelo Governo da Paraíba para abastecer 102
cidades que sofrem com a falta de água.
Irmãos contam que são duas viagens por dia de 30 minutos para buscar água (Foto: Taiguara Rangel/G1)
Maior açude está secando e transposição está parada
Paradoxalmente ao cenário da seca enfrentada pelos paraibanos, o maior
reservatório de água doce da Paraíba está com 45,4% de sua capacidade. O
volume diminui diariamente, pois uma das três comportas permanece
aberta com objetivo de abastecer a região de Igarassu, no Rio Grande do
Norte. Segundo a população, a situação está assim no açude de Coremas há
pelo menos 10 meses, 24 horas por dia