Por G1
Seis meses após
sua criação, a reforma trabalhista saiu do papel e
vem mudando aos poucos a dinâmica das relações entre patrão e empregado.
Contudo, ela ainda esbarra em forte resistência por parte de sindicatos e
insegurança jurídica nos tribunais. A nova lei trabalhista entrou em vigor em 11 de novembro de
2017.
De um lado, os
números mostram que as vagas de trabalho intermitente e as demissões por acordo
mútuo, duas das grandes novidades da nova lei, já são realidade. Nos tribunais,
as reclamações trabalhistas caíram drasticamente, assim como os pedidos de danos
morais.
Por outro lado,
acordos coletivos emperraram diante do impasse entre empresas e trabalhadores,
especialmente em pontos específicos que têm sido questionados na Justiça do
Trabalho. O fim da contribuição sindical obrigatória é um deles e já teve
reflexos na arrecadação dos sindicatos, que caiu 80%.
Para o
supervisor de informações sindicais do Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a insegurança jurídica existe
porque a lei deu margem a várias leituras.
“Ainda não se
sabe qual a interpretação correta de alguns pontos, por isso ela vem sendo
muito questionada”.
Carteira de trabalho (Foto: Rafael
Neddermeyer / Fotos Públicas)
MP caducou
Na esfera
política, a medida provisória que corrigia pontos polêmicos da nova lei deixou de valer sem ser votada e, com
isso, retrocedeu nas mudanças previstas. Nem a previsão do governo de que a
reforma geraria milhões de empregos se concretizou, com números do mercado de
trabalho apontando para o aumento do desemprego.
Já no Supremo
Tribunal Federal (STF) é discutida a primeira ação que questiona a
constitucionalidade da nova lei. Os ministros precisam decidir se o trabalhador
considerado pobre e com direito a justiça gratuito seria obrigado a pagar as
despesas do processo em caso de derrota, como estabelece a reforma. A votação
começou nesta quinta-feira (10), mas foi interrompida pelo pedido de vista de Luiz Fux e
não há data para o julgamento ser retomado.
Veja
abaixo os principais efeitos da nova lei trabalhista nos primeiros seis meses:
1. Demissões por acordo são realidade
Como era: Não existia. Antes, da reforma, só podia
sacar o FGTS depositado pelo empregador e os 40% da multa rescisória em cima do
valor quem fosse mandado embora sem justa causa. Em relação ao aviso prévio, a
empresa pode comunicar o trabalhador sobre a demissão com 30 dias de
antecedência ou pagar o salário referente ao mês sem que o funcionário precise
trabalhar.
O que diz
a nova lei: Haverá a
possibilidade de acordo na rescisão de contrato, com pagamento de metade do
aviso prévio e da multa de 40% sobre o FGTS. O empregado poderá ainda
movimentar até 80% do valor depositado na conta do FGTS. No entanto, não terá
direito ao seguro-desemprego. Entenda
O que
aconteceu: Ao menos 41 mil trabalhadores sacaram o Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço (FGTS) em comum acordo com o empregador para
serem demitidos, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Os
números vão de novembro a fevereiro deste ano. O total sacado nestes meses foi
de R$ 242 milhões, com um valor médio de R$ 5.891 por trabalhador.
Saques do FGTS por demissão em comum acordo
Em nº de trabalhadores que fizeram retiradas na Caixa
6306306.7506.75015.17015.17017.61417.614Nov/17Dez/17Jan/18Fev/1805k10k15k20k
Fonte: MTE
2. Queixas trabalhistas despencam
Como era: a lei não previa que o trabalhador pudesse
pagar os honorários do advogado da parte vencedora, caso perdesse a ação.
Também não havia multa por possível má-fé e custas por faltar nas audiências.
O que diz
a nova lei: O
trabalhador que faltar a audiências ou perder a ação terá de pagar custas do
processo e o valor devido ao advogado da empresa. Se o juiz entender que ele
agiu de má-fé, há multa e pagamento de indenização.
O que
aconteceu: O número
de novas reclamações abertas nas varas do trabalho caiu 45% no primeiro trimestre deste ano,
mostrou um levantamento feito pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). Entre
janeiro e março, a quantidade de novos processos despencou 44,79%. Foram
ajuizadas 355.178 ações, contra 643.404 no mesmo período de 2017. Na prática, o
processo ficou mais caro para o empregado e tende a inibir pedidos.
Número de processos trabalhistas no Brasil
Casos novos abertos por mês, em milhares
175,1175,1204,7204,7263,4263,4207,6207,6256,3256,3227,3227,3236,1236,1240,8240,8201,7201,7243,3243,3289,7289,784,284,289,689,6118,2118,2147,2147,2jan/17fev/17mar/17abr/17mai/17jun/17jul/17ago/17set/17out/17nov/17dez/17jan/18fev/18mar/1850100150200250300
Fonte: TST
3. Pedidos por dano moral caem
Como era: Não existia um limite para o valor que um empregado
podia pedir como indenização por danos morais por parte de seu empregador.
O que diz
a lei: Com a reforma, o
valor dos pedidos por danos morais passou a ser de no máximo 50 vezes o último
salário do trabalhador. Além disso, se o juiz entender que houve má fé, o autor
da ação pode ser multado em 10% do valor da causa.
O que
aconteceu: É possível
observar que o número de pedidos relacionados a danos morais despencou desde o
início da reforma, segundo dados fornecidos pelo TST ao G1. No
primeiro mês da nova lei, os pedidos somaram 81.507 casos. Já no mês seguinte,
as ocorrências caíram para 15.596.
Pedidos por danos morais
Número de reclamações nas varas do Trabalho
67.71767.71770.62970.62970.92770.92759.23359.23369.58869.58881.50781.50715.59615.59616.39916.39918.20218.20229.02629.02613.74413.74414.38414.38414.33714.33711.98611.98614.20114.20117.45617.4562.7212.7212.7812.7813.5003.5004.9324.9325.9045.9046.1266.1266.0296.0295.3425.3426.3276.3279.1759.175Total
danos moraisAssédio moralAcidente de
trabalhojun/17jul/17ago/17set/17out/17nov/17dez/17jan/18fev/18mar/18020k40k60k80k100k
Fonte: TST
4. Novas vagas para intermitentes; adesão é baixa
Como era: A lei trabalhista não previa o regime de
trabalho intermitente (por período, sem regularidade).
O que diz
a lei: O trabalho
intermitente é pago por período trabalhado. O empregador só convoca o
trabalhador quando há serviço. Ele pode ficar dias, semanas e até meses em
casa, e vai receber todos os benefícios proporcionais ao tempo trabalhado. O
trabalhador recebe por hora, que não poderá ser inferior ao mínimo nem ao dos
profissionais que exerçam a mesma função na empresa.
O que
aconteceu: As
contratações ficaram bem abaixo do que o governo esperava,
de dois milhões de empregos em 3 anos, ou 55 mil por mês. Passados 3 meses da
nova lei, a oferta de vagas de trabalho intermitente teve adesão de poucas
empresas, a maioria no comércio. Após cinco meses da reforma, a geração de
vagas não passou de 15 mil.
Trabalho intermitente no Brasil
(Foto: Infografia: Alexandre Mauro/G1)
5. Arrecadação sindical cai drasticamente
Como era: O recolhimento da contribuição aos sindicatos
pelo trabalhador formal era obrigatório e descontado da folha de pagamento.
O que diz
a lei: O
pagamento da contribuição sindical, que equivale a um dia de trabalho, não é
mais obrigatório. Se optar por fazer a contribuição, precisa informar que
autoriza expressamente a cobrança. A empresa só pode fazer o desconto com a sua
permissão. Entenda
O que
aconteceu: Dados do
Ministério do Trabalho enviados ao G1 mostram que a
arrecadação sindical (somando centrais, confederações, federações e sindicatos)
passou de R$ 170 milhões, em março do ano passado, para R$ 34 milhões em março deste
ano, uma redução da ordem de 80%. Desde o fim de 2017, sindicatos recorrem à
Justiça para tentar manter a cobrança, mas a maioria das ações tem sido
rejeitada no TST.
Arrecadação sindical
Volume arrecadado em milhões de R$
13132,62,631,731,711511523,623,6Centrais
sindicaisConfederaçõesFederaçõesSindicatosMarço/17Março/180255075100125
Fonte: TST
6. Negociações travam acordos coletivos
O que diz
a nova lei: Uma das maiores
novidades da nova lei é que os acordos coletivos podem prevalecer sobre o que
determina a lei em alguns pontos. Isso trouxe mudanças importantes, mas tem
gerado resistência por parte de sindicatos patronais e empregados.
O que
aconteceu: Com o fim da
contribuição sindical obrigatória e novas regras para jornada de trabalho e
férias, muitos acordos (feitos entre empresa e sindicato) e convenções
coletivas (que abrangem categorias de trabalho) permanecem sem negociação. Na
prática, o número de acordos no primeiro quadrimestre caiu 27% em relação ao
mesmo período do ano passado, enquanto a quantidade de convenções recuou 42%.
Convenções coletivas fechadas
Número de negociações no primeiro quadrimestre de cada ano
56569595129129153153122122123123939310510556561411411531531781781901901761761471471451457676194194267267252252287287228228245245130130155155239239313313352352303303288288185185JaneiroFevereiroMarçoAbril201020112012201320142015201620172018050100150200250300350400
Fonte: Dieese
7. Geração de empregos não foi sentida
Situação
anterior: A taxa de
desemprego encontrava-se no patamar de 12% em novembro do ano passado, quando a
nova lei trabalhista passou a valer.
Expectativa: O então ministro da Fazenda, Henrique Meirelles,
estimou em outubro do ano passado que a reforma trabalhista tornaria viável a geração de mais de seis milhões de empregos no
Brasil.
O que
aconteceu: Por ora, não há
sinais de que a reforma gerou novos empregos, apesar da criação de vagas em
novas modalidades, como o trabalho intermitente. O índice de desemprego voltou
a crescer desde o início da reforma. O nível de desempregados no Brasil atingiu 13,1% no
trimestre encerrado em março, maior nível desde maio do ano
passado. Isso significa que 13,7 milhões de pessoas estão sem emprego no país.
Evolução da taxa de desemprego
Índice no trimestre móvel, em %
13,713,713,613,613,313,3131312,812,812,612,612,412,412,212,2121211,811,812,212,212,612,613,113,1jan-fev-mar/17fev-mar-abrmar-abr-maiabr-mai-junmai-jun-juljun-jul-agojul-ago-setago-set-outset-out-novout-nov-deznov-dez-jan/18dez-jan-fevjan-fev-mar02,557,51012,515
Fonte: IBGE
8. Medida provisória deixou de valer
O que diz
a MP: A medida
provisória pretendia corrigir distorções da nova lei trabalhista. Ela
questionava pontos da lei que criavam insegurança jurídica e eram considerados
inconstitucionais por juristas. A MP criava regras complementaras para pontos
relacionados ao trabalho intermitente, de gestantes e lactantes em locais
insalubres, de autônomos, além de regras para jornada de 12 horas de trabalho
seguidas de 36 horas de descanso.
O que
aconteceu: A MP perdeu a validade sem ser votada,
fazendo com que as mudanças já aplicadas definidas na MP deixassem de valer. O
imbróglio jurídico sobre as regras criadas pela MP e que deixaram de valer
permanece.
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