- Pedro Ladeira/FolhapressO ministro Luis Roberto Barroso durante sessão plenária do STF
A decisão da primeira turma do STF (Supremo Tribunal Federal) de quepraticar aborto nos três primeiros meses de gestação não é crime cria um precedente para que juízes deem sentenças equivalentes em outros processos sobre o aborto, mas isso não descriminaliza a prática no Brasil.
Isso porque a decisão não foi tomada pelo plenário do STF como um todo, o que teria dado força de lei à medida. O julgamento foi feito por uma turma formada por cinco dos onze ministros do Supremo.
A sentença, no entanto, é importante pois pela primeira vez o Supremo descriminaliza a interrupção voluntária da gestação.
Juízes podem não considerar crime o aborto feito no início da gravidez mencionando essa decisão do STF, mas não estão obrigados a seguí-la."
Celso Ferenczi, especialista em direito constitucional da PUC-SP
Contudo, decisões que não veem crime no aborto podem ser revistas por juízes de segunda instância e até mesmo pelo próprio STF.
Para André Augusto Salvador Bezerra, juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo e presidente da Associação Juízes para a Democracia, a decisão pode influenciar muitos juízes de instâncias inferiores, que costumam citar jurisprudência do STF em suas decisões. "Existe novo precedente, até então inédito, que descriminaliza o aborto."
Entenda o caso
Na terça-feira (29), a 1ª turma do STF revogou a prisão preventiva de cinco pessoas que trabalhavam numa clínica clandestina de aborto em Duque de Caxias (RJ).
A questão girava em torno da existência de requisitos legais para as prisões. Mas, em seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso trouxe uma novidade. Para ele, as prisões não deveriam ser mantidas porque os próprios artigos do Código Penal que criminalizam o aborto no primeiro trimestre de gestação violam direitos fundamentais da mulher.
Outros dois ministros, Rosa Weber e Edson Fachin, concordaram com Barroso.Para eles, não haveria crime na prática do aborto. O relator, ministro Marco Aurélio, e Luiz Fux não se manifestaram sobre a descriminalização.
Juízes podem descriminalizar
A decisão da turma do STF é vista por especialistas como inédita. De acordo com o Código Penal, aborto pode ser realizado por um médico apenas quando a gravidez representa risco à vida da gestante ou quando ela resulta de estupro.
Em 2012, os ministros do STF consideraram que o aborto de feto anencéfalo também não constitui crime. Eles entenderam que o feto sem cérebro é "juridicamente morto". Agora, pela primeira vez há na Corte uma decisão com o entendimento de que não há crime em abortos feitos nos três primeiros meses de gestação. Essa decisão pode ser usada como orientação por juízes de outras instâncias, que tenham o mesmo entendimento sobre o aborto.
Médicos se sentirão seguros para realizarem abortos?
Em hospitais e consultórios, médicos enfrentam dilemas éticos frente a situações vividas por mulheres. Para Mauro Aranha, presidente do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), a decisão da turma do STF não deixa o médico em situação mais tranquila. "Não alivia e não cria segurança porque não tem poder vinculante, não é generalizável", diz.
O médico explica que o código de ética da medicina proíbe procedimentos que não sejam legais, ao mesmo tempo que diz que o médico não pode se omitir em situação que colocam em risco a mulher.
Existem situações dramáticas, em que a mãe não tem condições socioeconômicas, saúde mental ou ambiente familiar adequados, e procura um médico para realizar um aborto. O médico vai continuar em conflito porque lei não mudou"
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