Alheio à realidade,
presidente dá demonstrações de que não sabe a dimensão da crise à sua frente
Editorial G1
12/03/2020 - 00:00
/ Atualizado em 12/03/2020
Até agora o Ministério da Saúde tem
dado conta da ameaça do coronavírus, enquanto ela se dá por meio de viajantes
de estrato social mais elevado que foram contaminados em viagens ao exterior.
O ministro Luiz Henrique Mandetta e
equipe se articulam com secretarias estaduais e outros órgãos, enquanto tratam,
corretamente, de manter a população bem informada sobre a ainda incipiente
evolução da doença no país, e com informações úteis de prevenção, para o
cotidiano. Cria-se a consciência de que um surto no Brasil é inevitável, o que
é necessário para que a população também se proteja.
Mas o Executivo, com o presidente Jair
Bolsonaro na liderança, precisa trabalhar para que não apenas planos e
protocolos estejam prontos quando o vírus acelerar a sua disseminação, dentro
da sua característica, mas também a fim de preparar um amplo programa de
abertura de leitos na rede de saúde etc. A depender do estágio da contaminação
e das condições do paciente, o tratamento tem de ser feito em UTIs, um dos elos
frágeis do sistema de saúde no Rio e em outros estados.
Pode ser que o Ministério da Saúde já
tenha avançado nesta direção, mas é essencial o envolvimento do chefe da nação
no assunto. Tem sido assim no mundo. Do presidente chinês Xi Jinping ao
primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte. Mas infelizmente Jair Bolsonaro
continua a funcionar em outra frequência, longe da realidade factual.
A dessintonia fica exposta em
comentários e atitudes diante de uma crise mundial que pode rivalizar com a da
Grande Recessão, iniciada em 2008 em Wall Street. Na viagem aos Estados Unidos,
para jantar com o colega americano Donald Trump, o presidente brasileiro se
excedeu.
Desinformado, Bolsonaro demonstrou não
entender as implicações da vertiginosa queda da cotação do petróleo no mercado
internacional, de US$ 60 para US$ 30. Talvez condicionado pelo senso comum
entre os consumidores de combustíveis — por exemplo, os caminhoneiros, uma de
suas bases eleitorais —, de que quanto mais barato o petróleo, melhor. Não
necessariamente. O mergulho das cotações colocou em suspenso centenas de
bilhões de dólares de investimentos na exploração, inclusive no Brasil.
Prejudicou a Petrobras.
O presidente, assim, dá a entender que
lhe escapa a conexão entre a derrubada da cotação do petróleo, causada por uma
queda de braço entre dois grandes produtores, Arábia Saudita e Rússia, e as
forças recessivas já liberadas no mundo pela paralisação de linhas de produção
provocada pelo coronavírus a partir da China. Um problema turbina o outro.
Se entendesse essa mecânica, não
comentaria que queda de Bolsa “acontece esporadicamente”. Enebriado de
ideologia, o presidente também acusa a “grande mídia” pelo abundante noticiário
econômico negativo. Nem desdenharia do coronavírus — “não é isso tudo (...).” É
preciso trazer Bolsonaro para a realidade e explicar-lhe o que está
acontecendo.
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