Número é recorde nas unidades que atendem cerca de 8.000 adolescentes.
Para frequentar aulas, é necessário autorização judicial.
Nove adolescentes que cumprem medidas socioeducativas em unidades da Fundação Casa em todo o Estado de São Paulo vão começar o ano letivo de 2012 no ensino superior. O número é recorde na Fundação que hoje atende cerca de 8.000 jovens infratores, em regime de internação e semi-liberdade, em 140 unidades.
Dos nove jovens, seis conseguiram vaga pelo Programa Universidade para Todos (Prouni) e os outros três prestaram o vestibular próprio da instituição. Não houve selecionados pelo Sistema de Seleção Unificado (Sisu). Somente dois adolescentes não conseguiram bolsa integral, eles não entraram pelo Prouni e obtiveram desconto de 50% junto às universidades. As mensalidades serão pagas pela família.
Uma adolescente da unidade de Guarulhos vai estar musicoterapia; um jovem da unidade de Sorocaba vai cursar comércio exterior; um de Mogi Mirim, educação física. Em Franco da Rocha, dois jovens conseguiram vagas pelo Prouni em logística e produção cênica. Dois internos da unidade localizada na Rodovia Raposo Tavares entraram no curso de educação física. Em Iaras, no interior de São Paulo, dois adolescentes vão estudar em uma universidade de Avaré, um deles vai cursar educação física e o outro pedagogia.
Para frequentar as aulas, os estudantes precisam ter autorização judicial. Em alguns casos, solicita-se a extinção da medida ou a mudança para o regime de internação para, por exemplo, semi-liberdade (o adolescente volta para dormir na unidade) ou liberdade assistida (há um acompanhamento quinzenal, porém o jovem fica livre). Em última hipótese, quando não há liberação da Justiça, o adolescente vai às aulas acompanhado por um agente. “Neste caso há toda a cautela, para que o jovem não fique estigmatizado”, afirma Berenice Giannella, presidente da Fundação Casa, em entrevista ao G1.
Maioria tem defasagemApesar de a maioria dos internos ter entre 15 e 18 anos e a idade correta para cursar o ensino médio, eles chegam às unidades com defasagem no ensino e alguns nem mesmo estão alfabetizados. Em novembro do ano passado, 96% dos adolescentes não estudavam na série considerada ideal para sua idade na Fundação. Nas unidades eles são obrigados a frequentar as aulas que estão vinculadas à rede estadual de ensino de São Paulo.
No fim do ano passado, 99 adolescentes fizeram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O número é referente ao universo total dos jovens que estavam aptos a prestar a prova. Destes, 32 Prouni que oferece bolsas de estudos em universidades particulares, e nove no Sisu que seleciona vagas em instituições públicas. Em ambos os sistemas, as vagas são distribuídas de acordo com o desempenho no Enem.
"Quando vim para cá, faltava pouco para terminar o ensino médio. Prestei um exame de competência, estudei mais seis meses e me formei. Essa foi a terceira vez que prestei o Enem", relata o jovem, de 20 anos. A redação foi a parte da prova em que o rapaz obteve melhor desempenho: 840 pontos.
De acordo com a coordenadora pedagógica que acompanha a evolução dos internos da fundação, Luciana Monteiro, essa nota se deve ao tempo dedicado aos livros. "Ele lê bastante, estuda muito", conta. "A leitura é a base da prova do Enem, não só para a redação, mas para a interpretação das questões também", completa o jovem.
O curso de comércio exterior foi escolhido devido à proximidade das atividades com o dia a dia do rapaz. "Ele tem um tio que trabalha com logística, então ele já tem ideia de como é essa área. Comércio exterior está bem próximo e, caso a faculdade não consiga fechar uma turma para esse curso, ele já escolheu logística como segunda opção", afirma Luciana.
"Cheguei a ver cotas de todos os cursos e acabei decidindo por esse", conta o rapaz, que tinha nota suficiente para entrar na maioria das áreas. E ele não quer parar por aí. "Ainda quero fazer engenharia mecânica. Tenho muita vontade, mas preciso melhorar meu desenho. Além disso, é um curso muito difícil, concorrido, e eu quero estar preparado", afirma.
Perto de concluir a internação na unidade 3 da Fundação Casa de Sorocaba, ele conta que teve diversas oportunidades para escolher novos caminhos: "Fiz vários cursos aqui dentro, aprendi a tocar violão, cavaco e percussão, participo do time de handebol", relata o rapaz, que também canta e compõe. Além das atividades de lazer, a fundação oferece cursos de qualificação profissional em parceria com o Centro Paula Souza, como jardinagem, pintura em madeira e informática, e também cursos na área gastronômica - no caso dele, pizzaiolo.
Com o apoio da família e a ficha limpa, o jovem ganha liberdade em abril e demonstra determinação para mudar de vida. "Eu fiz muitos planos aqui dentro. Não quero que aconteça nada que possa estragar isso. Quero trabalhar e construir uma família", diz. Aos menores que, assim como ele, já cometeram atos infracionais, ele deixa um conselho: "O mau caminho é ilusório. Por um momento, parece bom, mas, quando você encara a realidade, vê que não é bem assim. Não vale a pena."
Internada em Guarulhos, a adolescente de 18 anos que vai estudar musicoterapia em uma universidade de São Paulo, conta os dias para se ver livre da medida socioeducativa. Na quinta-feira (9), quando a reportagem do G1 visitou a unidade da Fundação Casa, ela contou que estava lá há 1 ano e 15 dias, e após a aprovação no vestibular aguardava a definição o juiz sobre o pedido da extinção da medida.
A garota cumpre medida por co-autoria de uma infração considerada grave. Ela diz que não pretende reencontrar o ex-namorado, pois foi por causa dele que foi para a Fundação. Na época, a adolescente não tinha um bom relacionamento com a mãe e foi morar com outros familiares.E la não tem histórico de envolvimento com drogas ou álcool, é de família evangélica, e conhecida na unidade pelo seu bom comportamento, além da afinada voz.
A garota canta desde os 13 anos na igreja e sonha em se apresentar em um programa de TV (assista vídeo, ao lado, com trecho dela cantando).
“Aqui eu aprendi a ser mais observadora. Às vezes você confia tanto na pessoa e deixa de ver o que está certo ou errado, quando percebe já é tarde. Agora aprendi a confiar, meio que desconfiando”, afirma.
Com o curso de musicoterapia, ela pretende se especializar para trabalhar ajudando pessoas com a música, de preferência em projetos que envolvam crianças com deficiência. Depois, pretende ingressar em curso superior de música. Também quer aprender a tocar violão.
A jovem não cogita a hipótese de ter de ir para faculdade ainda internada, acompanhada por um agente da Fundação. “Tento imaginar como seria, mas não consigo."
Para ela, a desinternação é questão de dias, assim como o começo de nova vida. "Não penso em falar para meus novos amigos que passei por aqui. Foi uma fase, agora é seguir em frente. Passado é passado, e existe, sim, um certo preconceito. Quero fazer uma nova trajetória”, diz.
Dos nove jovens, seis conseguiram vaga pelo Programa Universidade para Todos (Prouni) e os outros três prestaram o vestibular próprio da instituição. Não houve selecionados pelo Sistema de Seleção Unificado (Sisu). Somente dois adolescentes não conseguiram bolsa integral, eles não entraram pelo Prouni e obtiveram desconto de 50% junto às universidades. As mensalidades serão pagas pela família.
Jovem conseguiu bolsa e vai cursar comércio exterior (Foto: Tássia Lima/G1)
Para frequentar as aulas, os estudantes precisam ter autorização judicial. Em alguns casos, solicita-se a extinção da medida ou a mudança para o regime de internação para, por exemplo, semi-liberdade (o adolescente volta para dormir na unidade) ou liberdade assistida (há um acompanhamento quinzenal, porém o jovem fica livre). Em última hipótese, quando não há liberação da Justiça, o adolescente vai às aulas acompanhado por um agente. “Neste caso há toda a cautela, para que o jovem não fique estigmatizado”, afirma Berenice Giannella, presidente da Fundação Casa, em entrevista ao G1.
Maioria tem defasagemApesar de a maioria dos internos ter entre 15 e 18 anos e a idade correta para cursar o ensino médio, eles chegam às unidades com defasagem no ensino e alguns nem mesmo estão alfabetizados. Em novembro do ano passado, 96% dos adolescentes não estudavam na série considerada ideal para sua idade na Fundação. Nas unidades eles são obrigados a frequentar as aulas que estão vinculadas à rede estadual de ensino de São Paulo.
Interna da unidade de Guarulhos quer seguir carreira na música e fará curso superior neste ano (Foto: Flavio Moraes/ G1)
“É um sucesso ter esse número de jovens na faculdade considerando a nossa realidade. A maioria chega nas unidades e já abandonou a escola. Prestar o Enem, concorrer a uma bolsa, significa uma vitória pessoal para esses adolescentes, mostra que eles podem ter sucesso em uma atividade lícita, fora do crime. Faz com que se sintam cidadãos e se sintam pertencendo à sociedade na qual vão voltar”, afirma Berenice Gianrella, presidente da Fundação Casa, em entrevista ao G1.No fim do ano passado, 99 adolescentes fizeram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O número é referente ao universo total dos jovens que estavam aptos a prestar a prova. Destes, 32 Prouni que oferece bolsas de estudos em universidades particulares, e nove no Sisu que seleciona vagas em instituições públicas. Em ambos os sistemas, as vagas são distribuídas de acordo com o desempenho no Enem.
Interno da unidade de Sorocaba sonha fazer
engenharia mecânica (Foto: Tássia Lima/G1)
Jovem aprovado no ProuniUma história de superação na Fundação Casa de Sorocaba, interior de São Paulo, prova que uma segunda chance, quando bem aproveitada, pode mudar a vida de qualquer um. Um jovem que vive no local há quase três anos obteve boas notas no Enem, acaba de conseguir uma bolsa no Prouni e já se matriculou para o curso de comércio exterior em uma faculdade particular da cidade.engenharia mecânica (Foto: Tássia Lima/G1)
"Quando vim para cá, faltava pouco para terminar o ensino médio. Prestei um exame de competência, estudei mais seis meses e me formei. Essa foi a terceira vez que prestei o Enem", relata o jovem, de 20 anos. A redação foi a parte da prova em que o rapaz obteve melhor desempenho: 840 pontos.
De acordo com a coordenadora pedagógica que acompanha a evolução dos internos da fundação, Luciana Monteiro, essa nota se deve ao tempo dedicado aos livros. "Ele lê bastante, estuda muito", conta. "A leitura é a base da prova do Enem, não só para a redação, mas para a interpretação das questões também", completa o jovem.
O curso de comércio exterior foi escolhido devido à proximidade das atividades com o dia a dia do rapaz. "Ele tem um tio que trabalha com logística, então ele já tem ideia de como é essa área. Comércio exterior está bem próximo e, caso a faculdade não consiga fechar uma turma para esse curso, ele já escolheu logística como segunda opção", afirma Luciana.
"Cheguei a ver cotas de todos os cursos e acabei decidindo por esse", conta o rapaz, que tinha nota suficiente para entrar na maioria das áreas. E ele não quer parar por aí. "Ainda quero fazer engenharia mecânica. Tenho muita vontade, mas preciso melhorar meu desenho. Além disso, é um curso muito difícil, concorrido, e eu quero estar preparado", afirma.
Perto de concluir a internação na unidade 3 da Fundação Casa de Sorocaba, ele conta que teve diversas oportunidades para escolher novos caminhos: "Fiz vários cursos aqui dentro, aprendi a tocar violão, cavaco e percussão, participo do time de handebol", relata o rapaz, que também canta e compõe. Além das atividades de lazer, a fundação oferece cursos de qualificação profissional em parceria com o Centro Paula Souza, como jardinagem, pintura em madeira e informática, e também cursos na área gastronômica - no caso dele, pizzaiolo.
Com o apoio da família e a ficha limpa, o jovem ganha liberdade em abril e demonstra determinação para mudar de vida. "Eu fiz muitos planos aqui dentro. Não quero que aconteça nada que possa estragar isso. Quero trabalhar e construir uma família", diz. Aos menores que, assim como ele, já cometeram atos infracionais, ele deixa um conselho: "O mau caminho é ilusório. Por um momento, parece bom, mas, quando você encara a realidade, vê que não é bem assim. Não vale a pena."
Interna de Guarulhos vai estudar musicoterapia
(Foto: Flavio Moraes/G1)
Paixão pela música(Foto: Flavio Moraes/G1)
Internada em Guarulhos, a adolescente de 18 anos que vai estudar musicoterapia em uma universidade de São Paulo, conta os dias para se ver livre da medida socioeducativa. Na quinta-feira (9), quando a reportagem do G1 visitou a unidade da Fundação Casa, ela contou que estava lá há 1 ano e 15 dias, e após a aprovação no vestibular aguardava a definição o juiz sobre o pedido da extinção da medida.
A garota cumpre medida por co-autoria de uma infração considerada grave. Ela diz que não pretende reencontrar o ex-namorado, pois foi por causa dele que foi para a Fundação. Na época, a adolescente não tinha um bom relacionamento com a mãe e foi morar com outros familiares.E la não tem histórico de envolvimento com drogas ou álcool, é de família evangélica, e conhecida na unidade pelo seu bom comportamento, além da afinada voz.
A garota canta desde os 13 anos na igreja e sonha em se apresentar em um programa de TV (assista vídeo, ao lado, com trecho dela cantando).
“Aqui eu aprendi a ser mais observadora. Às vezes você confia tanto na pessoa e deixa de ver o que está certo ou errado, quando percebe já é tarde. Agora aprendi a confiar, meio que desconfiando”, afirma.
Com o curso de musicoterapia, ela pretende se especializar para trabalhar ajudando pessoas com a música, de preferência em projetos que envolvam crianças com deficiência. Depois, pretende ingressar em curso superior de música. Também quer aprender a tocar violão.
A jovem não cogita a hipótese de ter de ir para faculdade ainda internada, acompanhada por um agente da Fundação. “Tento imaginar como seria, mas não consigo."
Para ela, a desinternação é questão de dias, assim como o começo de nova vida. "Não penso em falar para meus novos amigos que passei por aqui. Foi uma fase, agora é seguir em frente. Passado é passado, e existe, sim, um certo preconceito. Quero fazer uma nova trajetória”, diz.
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