Os três réus negam crime de homicídio doloso; quatro morreram em 1986.
Julgamento começa nesta segunda em Taubaté, interior de São Paulo.
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Após 24 anos, três médicos acusados de matar quatro pacientes em Taubaté, no Vale do Paraíba, interior de São Paulo, ao retirar rins irregularmente das vítimas como parte de um suposto esquema de tráfico de órgãos humanos começarão a ser julgados na manhã desta segunda-feira (17). O início do julgamento está programado para as 9h.
(Veja ao lado vídeo feito pelo G1 sobre o caso, publicado em setembro de 2010)
De acordo com a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o júri popular será no Fórum Central da cidade e deverá durar três dias.
Serão ouvidos os depoimentos de 17 testemunhas, sendo seis delas da acusação, dez da defesa, e uma do juízo. Posteriormente, os médicos serão interrogados, e ocorrerão os debates do Ministério Público e advogados de defesa. Os sete jurados vão, então, se reunir para decidir se os acusados são culpados ou inocentes do crime de homicídio doloso. A previsão é que a leitura da sentença pelo juiz Marco Antônio Montemor ocorra na noite de quarta-feira (19). Caso sejam condenados, cada um poderá pegar pena de 6 a 20 anos de reclusão.
Todos os réus respondem ao crime em liberdade e no exercício legal da profissão. A convicção da Promotoria de que eles cometeram assassinatos é amparada pelos depoimentos de testemunhas, que são outros médicos, enfermeiros e familiares das vítimas, além de provas técnicas.
Segundo a denúncia feita pela Promotoria à Justiça, em 1986 o neurocirurgião Mariano Fiore Júnior, agora com 62 anos, o urologista Rui Noronha Sacramento, de 60 anos, e o nefrologista Pedro Henrique Masjuan Torrecillas falsificaram prontuários de pacientes vivos, informando que eles estavam com morte encefálica (sem atividade cerebral e sem respiração natural) para convencer suas famílias a autorizarem a retirada dos rins para doação.
Ministério PúblicoDe acordo com o promotor Márcio Augusto Friggi de Carvalho, as vítimas morriam por outras complicações em razão da ausência desses órgãos. “Exames mostram que as vítimas estavam com sinais vitais, mas mesmo assim tiveram seus rins retirados, vindo a falecer por conta disso”, afirmou ao G1.
O Ministério Público informa que, nos anos 80, a equipe médica da Faculdade de Medicina de Taubaté (Unitau) usava o extinto Hospital Santa Isabel de Clínicas (Hosic), onde atualmente está localizado o Hospital Regional de Taubaté, para cometer os crimes e desvio de conduta ética e moral. Como hoje, na época a instituição era popular, mas atendia convênios médicos particulares.
Segundo a denúncia, os órgãos abasteciam uma rede de transplantes. A suspeita é que os rins estavam sendo vendidos, sendo clínicas particulares de São Paulo as beneficiárias. Isso nunca foi comprovado pela Polícia Civil, que demorou a concluir o inquérito. O destino dos órgãos também é desconhecido. É possível que eles tenham sido transplantados em hospitais paulistanos.
A acusação da Promotoria contra os médicos se baseia somente no homicídio doloso. Segundo Friggi de Carvalho, laudos do Instituto Médico-Legal (IML), da Polícia Técnico Científica e do Conselho Regional de Medicina (Cremesp) concluíram que os pacientes não estavam mortos antes da retirada dos rins.
Pela denúncia, José Miguel da Silva, Alex de Lima, Irani Gobo e José Faria Carneiro estavam vivos quando entraram no extinto Hosic e morreram após a retirada desses órgãos.
Durante o processo, testemunhas relataram que até uma espécie de médium foi apresentado pelos médicos aos parentes para dizer que havia entrado em contato com o morto no plano espiritual e ele havia pedido para os familiares autorizarem a doação.
A reportagem do G1 não conseguiu localizar os advogados dos três médicos e os acusados para comentar o assunto. Em setembro de 2010, em reportagem publicada pelo G1, os defensores dos réus negaram as acusações de que seus clientes forjaram documentos. Alegando inocência, a defesa deles sustentou que as retiradas dos rins foram feitas em pessoas que tiveram morte cerebral diagnosticada. Os réus disseram que exames de arteriografia mostraram que os pacientes estavam clinicamente mortos, em coma irreversível ou morte encefálica.
Os réus já disseram que os órgãos iam para o programa de transplantes de um convênio entre a Unitau e o Hospital das Clínicas (HC), da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista. Mas segundo o promotor Friggi de Carvalho, esse acordo jamais existiu. “Não há nenhum registro disso em lugar algum”, disse.
Caso KalumeO caso veio à tona em 1987, quando o então diretor da mesma faculdade, o médico Roosevelt Kalume, procurou o Cremesp para informar que um programa ilegal de retirada de rins de cadáveres para doação e transplantes acontecia sem o seu conhecimento e aval.
Na época, o assunto ficou conhecido nacionalmente e a imprensa o tratou como caso Kalume, em referência ao sobrenome do denunciante. O escândalo culminou com a abertura de inquérito policial em 1987 e até virou alvo em 2003 da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apurava a atuação de organizações criminosas atuantes no tráfico de órgãos no Brasil. Um dos depoimentos mais marcantes em Brasília foi de uma enfermeira que contou ter visto um paciente ter os órgãos retirados enquanto se debatia na mesa de cirurgia. A mulher também disse que um médico pegou o bisturi, enfiou no peito do homem e ele morreu. Nesta segunda, ela deverá falar pela primeira vez à Justiça sobre o que viu.
Os médicos foram absolvidos das acusações de tráfico de órgãos e eutanásia nos procedimentos administrativos e éticos do Cremesp, em 1988, e do Conselho Federal de Medicina (CFM), em 1993. Além disso, o caso em Taubaté ajudou na discussão a respeito da elaboração da atual lei que trata sobre a regulamentação dos transplantes de órgãos no país até hoje. Segundo o CFM, a lei é a 9.434, de 1997.
Em 1993, Kalume chegou a publicar um livro sobre o caso. Para narrar os fatos, ele usou nomes diferentes dos personagens da vida real. “Transplante”, no entanto, deixou de ser publicado. Apesar disso, a obra também faz parte do processo contra os médicos.
Já em 1996, após quase dez anos de investigação, a Polícia Civil de Taubaté concluiu o inquérito que responsabilizou quatro médicos pelas mortes de quatro pacientes. Um dos acusados morreu em maio deste ano.
Segundo a denúncia, os órgãos abasteciam uma rede de transplantes. A suspeita é que os rins estavam sendo vendidos, sendo clínicas particulares de São Paulo as beneficiárias. Isso nunca foi comprovado pela Polícia Civil, que demorou a concluir o inquérito. O destino dos órgãos também é desconhecido. É possível que eles tenham sido transplantados em hospitais paulistanos.
A acusação da Promotoria contra os médicos se baseia somente no homicídio doloso. Segundo Friggi de Carvalho, laudos do Instituto Médico-Legal (IML), da Polícia Técnico Científica e do Conselho Regional de Medicina (Cremesp) concluíram que os pacientes não estavam mortos antes da retirada dos rins.
Pela denúncia, José Miguel da Silva, Alex de Lima, Irani Gobo e José Faria Carneiro estavam vivos quando entraram no extinto Hosic e morreram após a retirada desses órgãos.
Durante o processo, testemunhas relataram que até uma espécie de médium foi apresentado pelos médicos aos parentes para dizer que havia entrado em contato com o morto no plano espiritual e ele havia pedido para os familiares autorizarem a doação.
A reportagem do G1 não conseguiu localizar os advogados dos três médicos e os acusados para comentar o assunto. Em setembro de 2010, em reportagem publicada pelo G1, os defensores dos réus negaram as acusações de que seus clientes forjaram documentos. Alegando inocência, a defesa deles sustentou que as retiradas dos rins foram feitas em pessoas que tiveram morte cerebral diagnosticada. Os réus disseram que exames de arteriografia mostraram que os pacientes estavam clinicamente mortos, em coma irreversível ou morte encefálica.
Os réus já disseram que os órgãos iam para o programa de transplantes de um convênio entre a Unitau e o Hospital das Clínicas (HC), da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista. Mas segundo o promotor Friggi de Carvalho, esse acordo jamais existiu. “Não há nenhum registro disso em lugar algum”, disse.
Caso KalumeO caso veio à tona em 1987, quando o então diretor da mesma faculdade, o médico Roosevelt Kalume, procurou o Cremesp para informar que um programa ilegal de retirada de rins de cadáveres para doação e transplantes acontecia sem o seu conhecimento e aval.
Na época, o assunto ficou conhecido nacionalmente e a imprensa o tratou como caso Kalume, em referência ao sobrenome do denunciante. O escândalo culminou com a abertura de inquérito policial em 1987 e até virou alvo em 2003 da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apurava a atuação de organizações criminosas atuantes no tráfico de órgãos no Brasil. Um dos depoimentos mais marcantes em Brasília foi de uma enfermeira que contou ter visto um paciente ter os órgãos retirados enquanto se debatia na mesa de cirurgia. A mulher também disse que um médico pegou o bisturi, enfiou no peito do homem e ele morreu. Nesta segunda, ela deverá falar pela primeira vez à Justiça sobre o que viu.
Os médicos foram absolvidos das acusações de tráfico de órgãos e eutanásia nos procedimentos administrativos e éticos do Cremesp, em 1988, e do Conselho Federal de Medicina (CFM), em 1993. Além disso, o caso em Taubaté ajudou na discussão a respeito da elaboração da atual lei que trata sobre a regulamentação dos transplantes de órgãos no país até hoje. Segundo o CFM, a lei é a 9.434, de 1997.
Em 1993, Kalume chegou a publicar um livro sobre o caso. Para narrar os fatos, ele usou nomes diferentes dos personagens da vida real. “Transplante”, no entanto, deixou de ser publicado. Apesar disso, a obra também faz parte do processo contra os médicos.
Já em 1996, após quase dez anos de investigação, a Polícia Civil de Taubaté concluiu o inquérito que responsabilizou quatro médicos pelas mortes de quatro pacientes. Um dos acusados morreu em maio deste ano.
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